“Põe-me creme”, “Tenho fome”, “Deixa-me só ir à casa de banho”.


Este podia perfeitamente ser o início de uma tira de um livro de Calvin and Hobbes, ou eventualmente as primeiras frases balbuciadas pelo Mário do Big Brother numa qualquer manhã de sábado… Só que não.

Permitam-me que vos alerte para o real fundamento destes (e outros) pedidos, afirmações, exigências, ultimatos, chamem-lhes o que quiserem: é uma armadilha!! Fête muita attention, isto são pequenos testes engendrados pela mãe da criança para testar a nossa resiliência pré-paternal! Autênticos pântanos de areia movediça prontos para engolir o pai mais incauto!

Atentemos a este exemplo: chegaste do trabalho, foste com o cão à rua, deste um jeito à casa, fizeste o jantar, puseste a mesa, jantaram, levantaste a mesa, arrumaste a cozinha, e quando finalmente aconchegas as nalgas no sofá e pegas no comando da Playstation para uns merecidos minutos de entretenimento vazio e infantil… “Ohhh, e não me pões creme nos pés?”. Já foste. São pelo menos 30 minutos de esfreganço (e é bom que seja sincero e convincente, porque se for assumidamente contrariado ainda dura mais) e depois, como é óbvio, com as mãos todas besuntadas de Creme Barral, já não vais pegar em comando nenhum, e como entretanto já puseste o trem de aterragem e já nem tens forças para te levantar do sofá e ir lavar as mãos pronto, o teu serão acabou ali.

Vejamos também esta situação: 14h30: acabamos de almoçar, 15h00: “Já comia qualquer coisa”, 15h02: “Estou cheia de fome”, 15h05: “A sério, já me estou a irritar, pára aí em qualquer lado, já te disse que preciso de comer!”. Sim, isto escala depressa.

Terminemos com este exemplo: Preparam-se para sair de casa. A mãe da criança grita “Despacha-te, estou há que tempo há tua espera, és uma princesa!”. Tu despachas-te a correr, certificas-te que está tudo ok e que ela está pronta para sair também, dás o biscoito ao cão para ele ficar entretido, pegas nas tuas coisas, na mochila dela, nos 10 sacos que têm para levar para baixo e no carrinho que decidiram que era hoje que ia para o porta bagagens do carro, e quando já estás do lado de fora da porta e a parecer um camelo albardado para uma travessia do Sahara ela diz-te lá do fundo do corredor: “Deixa-me só ir à casa de banho num instante”…

Poderia enumerar aqui mais uns quantos exemplos, mas creio que já perceberam onde quero chegar, e o ponto principal deste post não são os exemplos, mas sim a moral da história. E a moral desta história foi escrita há já alguns anos atrás por um grandioso poeta português de seu nome Tomás Taveira e reza assim: aguenta e não chora.

A realidade é que, a não ser que tenhas sido péssimo na tua escolha, a mãe da tua criança não há-de ser uma criatura pérfida cuja única missão neste mundo é testar-te ou simplesmente fazer a tua vida num inferno. Às vezes (ou sempre, ou quase vá…) aquilo que a nós nos pode parecer um capricho inoportuno, para a mãe da criança é uma necessidade real e premente, ou algo que lhe pode trazer um grande alívio.

Por outro lado, qualquer derrapagem que tenhas nestes affairs culminará certamente num chimbalão daqueles épicos, por isso, nem que seja para o evitares e te poupares a alguns insultos e achincalhos, põe-te fresco e aguenta-te à bomboca. Quanto mais depressa aceitares este teu destino e o começares a encarar com naturalidade e até com algum prazer, melhor.

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