365 dias
E agora para um
pouco de mariquice ao mais alto nível (coisa rara por estes lados, mas que de vez em quando cai
bem e dá imeeensas visualizações)…
O que é que
sucede? Sucede que, assim sem eu dar conta, já passou mais de um ano e meio
desde que eu tive a infeliz ideia de criar este repositório de conjecturas abjectas
sobre o admirável mundo da paternidade. Que vergonha… Que desleixe… Fez-se um ano
e nem uma festa, nem uns foguetes, nem um canhãozito a cuspir anões… Nada…
E como é que eu
me dei conta disto (e é esse o verdadeiro assunto deste post)? Dei-me conta
disto porque, de forma ainda mais inacreditável, a Criança com a qual partilho
o nome deste Blog, também fez, ela própria, um ano.
Um ano! Como é
que é possível? Parece que foi ontem…
Quase que ainda
consigo sentir aquele cheiro estéril da sala onde esperámos horas esquecidas
que ela acabasse de se arranjar para finalmente sair. Quase que ainda me
consigo sentir a rir e a chorar ao mesmo tempo, numa reacção totalmente
involuntária do meu corpo, na primeira vez que a vi. A alegria tremenda de a
ver limpa e depositada no colo maravilhado da sua mãe. O nojo profundo ao
recusar a amável oferenda da placenta para levar para casa e cozinhar. O misto
de pânico, ansiedade e êxtase do primeiro colo. Os insultos extremamente
ofensivos que contive quando me convidaram afavelmente a sair e a voltar no dia
seguinte... Parece que foi ontem…
Mas não… Já
passaram 365 dias. E se em 365 dias de uma vida pacata e sem grandes aventuras
já acontece muita coisa, em 365 dias com uma criatura recém nascida a cargo,
acontece muito mais.
Nestes últimos
365 dias aprendi a trocar fraldas “em casa, no carro, em todo o lado”.
Dei
leite, dei papa, dei sopa, dei fruta, dei carne e peixe (só não dei mama,
acreditem ou não) e vi-a deixar de precisar da minha ajuda para tudo isto.
Dei
banhos em banheiras pequenas, médias e grandes, até perceber que já não dava
mais para fugir à posição desconfortável de lhe dar banho na nossa banheira.
Vi-a estática, a virar-se, a gatinhar, a levantar-se e a andar.
Limpei cocó e
chichi do chão, do troca fraldas, da cama dela, da nossa cama e de uns quantos
outros sítios que é melhor nem lembrar.
Chorei ao deixá-la na creche (sem
vergonhas, quero que se f#da).
Aprendi que quando o pediatra diz que não é
grave e que é só por precaução ou descargo de consciência, na maioria das vezes
é desnecessário e é só para gastar dinheiro.
Percebi que posso gastar 100€ num brinquedo que ela vai preferir uma garrafa de plástico com arroz lá dentro.
Percebi que o preço e aspeto das creches nem sempre é directamente proporcional à felicidade que as crianças lá vão viver.
Percebi que posso gastar 100€ num brinquedo que ela vai preferir uma garrafa de plástico com arroz lá dentro.
Percebi que o preço e aspeto das creches nem sempre é directamente proporcional à felicidade que as crianças lá vão viver.
Sustive a respiração com quedas, tosses,
engasgos e vómitos.
Vibrei com os primeiros sons, com os primeiros sorrisos e com
as primeiras interacções com os animais.
Aprendi a relativizar coisas como uma
chucha que cai ao chão, uma pequena queda ou uma cabeçada leve numa porta, mas
apercebi-me que, pelo contrário, há algo em ti que vai mudando, há coisas que
vão deixando de ser assim tão relativas, e que 3 dias fora em trabalho, por
exemplo, se tornam, sem dares conta, num suplício muito difícil de suportar.
Aprendi que há coisas que duram pouco, como o termómetro para a água da
banheira ou o fervedor para os biberons e chuchas, e outras que duram muito,
como o pano/marsúpio, os redutores ou o saco cama.
Aprendi que, da
mesma maneira que tens amigos que compreendem e respeitam a tua nova condição e
a tua postura em relação a ela, também tens outros que não sabem muito bem
lidar com isso, e isso é normal e não deve ser razão para afastamentos.
Percebi
que a educação é relativa e que não vale a pena embarcar em fundamentalismos.
Aprendi que uma criança precisa de controlo, segurança e supervisão, mas que
também precisa de viver, pôr coisas na boca, ir à rua, cair, sujar-se e mexer
no cão.
Aprendi que um casal com vida antes de ter filhos pode continuar a ser
um casal com vida depois de ter filhos, que não têm que passar a ser um par de
monges budistas confinados ao seu templo T3, e que esse equilíbrio é essencial
para o bem estar de uma família.
Percebi que os meus dias continuam a ter 24h,
mas que dá a ideia de que antes tinham 40.
Aprendi que quando me levanto mais
cedo o fim de semana parece muito maior, e que quando ela tem dentes a nascer,
as noites parecem muuuuito mais pequenas.
Aprendi que, quando o tema são
crianças, mais vale calar-me quando oiço comentários despropositados que
claramente vão conduzir a discussões inúteis mas que, por outro lado, tenho que falar
alto quando sinto a minha posição enquanto pai menosprezada (happens a lot).
Aprendi
a conhecer, por grau de inclinação, qualidade do piso e quantidade de sombra,
todos os parques de Lisboa e arredores, bem como os respectivos estacionamentos.
Aprendi a gerir a minha vida em prol de uma outra prioridade que não as minhas
vontades, e a não ver nisso um problema nem uma vergonha.
Mentalizei-me que ser pai é como ser adepto do
Benfica: sabes que por vezes vai doer, mas estás claramente consciente de que, no dia em que
começa, não acaba mais.
Tanta coisa em apenas 365 dias…
365 dias caramba…
Parece que foi
ontem.
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