A creche. Ai a creche…



Há uns meses atrás, quando começamos a pesquisar sobre este tema, rapidamente percebemos que, a par da alimentação, do sono, das fraldas, da amamentação, do transporte e de todas as coisas que pairam em torno dos bebés, também a história da creche era um tema fraturante e que gera grandes discórdias e, no caso de alguns fóruns, grandes enxovalhos e lavagens de roupa suja.

Quem coloca os filhos na creche “logo” (assim que acabam as licenças “normais”, ou seja, mais ou menos aos 6 meses) diz que é o melhor para a socialização, para o desenvolvimento e para a criação de anticorpos; os que optam por não o fazer dizem que as creches tão cedo só servem para apanhar doenças, que as crianças tão pequenas têm que estar é junto dos pais e que é uma violência afastá-las tão cedo.

No nosso caso a escolha foi simples: não temos pais ricos (nem reformados), não somos clientes do Totta (já fomos, mas juramos para nunca mais) e, por isso, por muito que nos tenha custado, cedo tivemos que nos mentalizar que, assim que acabassem as licenças (que partilhamos), a Maria Jagunça teria que ir para a creche, porque as nossas contas não se pagam sozinhas, e por isso há que trabalhar.

Para além disto, fazemos assumidamente, e sem medos, parte da milícia que acredita que ir para a creche cedo não mata ninguém e que pode ser uma mais valia no desenvolvimento das crianças a vários níveis (nada contra a quem faz/pensa diferente, atenção).

E assim foi… Procuramos uma creche (já falei desse drama aqui), fomos conhecer, e embora o espaço não nos enchesse totalmente as medidas (não tinha espaço exterior, que nós valorizamos muito), as pessoas conquistaram-nos e achamos que deveria ser ali, porque na verdade, aos 6 meses, pouco importa o espaço ou os brinquedos… Queremos é que haja mimo e cuidado.

E pronto, aos 6 meses da criança (mais coisa, menos coisa), e praticamente findos os nossos dias de soltura profissional, lá fomos nós, armados em valentes, para o primeiro dia de habituação (período em que a criança fica na creche apenas algumas horas e com a possibilidade de estar acompanhada pelos pais, para se ir habituando sem ser à bruta).

Esta é a parte em que as experiências diferem e os caminhos se separam de criança para criança. A Maria do Carmo sempre foi uma criança “sociável” e que não estranha caras nem sítios novos, antes pelo contrário, acho que herdou completamente os genes “exploradores” de seu pai, e por isso a “habituação” foi muito simples: chegámos à creche; na curta distância (cerca de 20m) que separa a entrada da creche da entrada da sala já chorávamos os dois; a criança, sempre na maior, estendeu os braços à educadora, foi brincar e cagou bem em nós… E pronto. Está feito. Mordemos os lábios com força enquanto pensávamos em segredo: “Devias estar a chorar sacana, nós somos os teus pais e estamos a ir embora. Chora. Chora!!!”, demos meia volta e saímos de fininho. Voltamos passado 3 horas. Estava na maior. Tinha comido, tinha dormido, já tinha conhecido os colegas e já estava a brincar no tapete. Estava feita a habituação. No dia seguinte ficou meio dia, que correu exactamente com a mesma tranquilidade do primeiro, e ao terceiro dia já entramos na rotina normal de ficar de manhã e sair a meio da tarde, que sua mãe ainda gozava das horas das maminhas.

E a malta pergunta: “Mas como é que foram capazes?? Dois dias e já deixam a bicha assim??”

E eu respondo com outra pergunta: “Deveríamos ter forçado que ela se sentisse mal? Deveríamos ter imposto mais a nossa presença até ao ponto de ela sofrer quando saíssemos? Deveríamos ter causado/prolongado nós um sofrimento que não estava a existir só para ficarmos de bem com a nossa consciência só porque não despejámos a criança na creche e viemos embora?”.

A nós pareceu-nos melhor assim. Estávamos à distância de um telefonema e de 5 minutos de caminho caso alguma coisa corresse mal, mas estávamos certos de estarmos a dar a distância suficiente para que tudo corresse bem. Obviamente que se a reacção dela tivesse sido outra, também a nossa seria diferente, mas não sendo, para quê complicar?

Passados 6 meses de creche (durante os quais conseguimos contar pelos dedos de uma mão de um talhante acidentado as vezes que ela chorou ao ficar), chegou a hora de mudar de escola, para um sítio mais perto de casa, com muito espaço exterior e com criançada mais crescida. E a história repetiu-se… No dia em que fomos à primeira reunião, por ela já tinha lá ficado… E quando chegou o dia de finalmente ficar, parecia que já lá “vivia” há anos…

Morais da história (que são duas):

1 - Quer seja por opção, quer seja por falta de alternativa, começar a deixar as crianças na creche logo aos 6 meses não é, nem deve ser, vergonha ou motivo de auto flagelação para ninguém, e quem vos fizer sentir isso (porque há sempre quem o faça) é um ovo podre faccioso que percebe tanto de crianças (e de pais) como eu (que fui para Humanidades para fugir à matemática) percebo de engenharia aeronáutica.

2 – Custa-nos começar a deixar as nossas crianças na creche? Custa. Podemos, por isso, dificultar-lhes todo o processo a elas? Nop! A ida para a creche não tem que ser um drama, e há crianças, como a nossa por exemplo, que encaram isso com uma grande naturalidade. Eu diria que o melhor que temos a fazer é aproveitar isso, relaxar, tentar desdramatizar, ver como corre sem interferirmos e sem nos impormos só para nos sentirmos menos mal por estarmos a deixá-los ali, tão pequeninos, para podermos ir trabalhar, ou simplesmente porque achamos que é o melhor para o desenvolvimento deles. Não há crime nenhum nisso. Não quer dizer que gostemos menos deles. E quem vos fizer sentir isso (porque há sempre quem o faça) é um ovo podre faccioso e que percebe tanto de crianças (e de pais) como eu (que fui para Humanidades para fugir à matemática) percebo de engenharia aeronáutica.

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